Quatro Coiotes, o terceiro LP do RPM, uma raridade hoje em dia.

Quatro Coiotes trabalho isento de hits, mas ainda sim muito bom.



O RPM foi uma das bandas com trajetória mais curiosa dentre as formações que estouraram nos anos 80. Olhando para trás, a impressão que temos é que o sucesso atingido por Paulo Ricardo, Luiz Schiavon, Fernando Deluqui e Paulo Pagni foi meramente circunstancial, num momento específico do tempo em que foram colocados juntos a euforia do Plano Cruzado, a abordagem tecnopop assumida pelo quarteto, a ênfase na figura de um galã baixista que sensualizava nas interpretações em programas de auditório e, acima de tudo, um belo disco de estreia..

Creiam, amigos, em 1986/87, o RPM foi uma força da natureza. As rádios procuravam evitar, mas era impossível girar o dial e não esbarrar com Louras Geladas, Rádio Pirata, Revoluções Por Minuto, Olhar 43 ou A Cruz E A Espada, todas canções do primeiro disco, Revoluções Por Minuto, lançado em março de 1985, mas que permaneceu vivo nas paradas de sucesso por mais de um ano. 

A banda partiu para os píncaros do sucesso com o lançamento, um ano e três meses depois, de Rádio Pirata Ao Vivo, fruto das apresentações intermináveis que a banda fazia pelo país, sendo levada de um canto a outro por um luxuoso ônibus que exibia as marcas de Manuel Poladian, empresário de vários artistas da MPB, que agora procurava um lugar naquele lucrativo ramo do rock nacional. 

O disco ao vivo manteve o RPM forte nas paradas e cravou mais hits, alguns até improváveis, como a versão de London London, de Caetano Veloso ou Flores Astrais, dos Secos e Molhados. Ao lado destas, outro monstro nas paradas de sucesso foi Alvorada Voraz, além das versões “live” das canções do primeiro disco. Foram mais de dois milhões e setecentas mil cópias vendidas.

Ao fim de 1987, o RPM se esgotara em todos os sentidos. Os integrantes não se falavam mais, a banda estava com o futuro incerto, a gravadora CBS, a mesma de Roberto Carlos, que tivera sua vendagem neste biênio arranhada severamente pelo desempenho dos rapazes, também estava com medo de perder uma de suas mais poderosas galinhas dos ovos de ouro. 

Haviam lançado um EP com Milton Nascimento, cujo hit, “FEito Homem”, fracassou nas paradas de sucesso. Além disso, o projeto do selo da banda, RPM Discos, também foi pro buraco a partir do clamoroso fracasso de seu primeiro lançamento, Fósforos de Oxford, o disco da banda do ex-Titãs Ciro Pessoa, o Cabine C, que, apesar de todo o tratamento visual, gráfico e capricho na edição em LP, não conseguiu um desempenho de vendas satisfatório. 

Para surpresa e comoção gerais, a banda anunciaria seu fim ainda em 1987.

Mas a CBS ainda tinha alguns coelhos na manga. Era sabido que a banda chegara ao fim por conta de divergências em todos os níveis, entre eles, a direção que a sonoridade do novo disco deveria tomar. 


Schiavon dizia que deveriam fazer algo mais no estilo “funk new romantic de branco”, como o Duran Duran faria em Notorious. Paulo Ricardo, Deluqui e Pagni queriam um disco mais rock, com menos teclados. 

Para aplacar as rusgas, a gravadora concordou em fazer um disco duplo, com bastante espaço para todos os egos. Mesmo assim, a divisão da autoria das canções e mesmo a quantidade de músicas que cada um teria no disco, levou a novo impasse, resolvido pela gravadora com mais uma concessão: 

Schiavon poderia gravar um disco solo, Paulo Ricardo também faria um trabalho sozinho e a dupla Deluqui/Pagni, um disco conjunto. 

Finalmente aceitaram e iniciaram o trabalho de composição, no qual Paulo Ricardo faria as letras e o grupo – com ênfase para Schiavon e Deluqui – comporiam as melodias. 

A CBS, cheia de medo de novo fracasso, ofereceu ao grupo uma estadia de 30 dias em Búzios para a produção do novo disco, além de propor que o trabalho fosse mixado em Los Angeles. 

Com tantos privilégios, o RPM declara oficialmente a sua volta e lança, em abril de 1988, seu terceiro disco.

Na capa uma foto com pouca luz da banda. Além disso, nenhuma outra informação, a não ser um “RPM” esmaecido. 

A produção ficara com Luiz Carlos Maluly, que já produzira discos para a banda Metrô e para César Camargo Mariano mas que, a partir dos anos 90, assinaria produções para artistas como Leandro e Leonardo e Bruno e Marrone. 

O RPM apresentava seu melhor disco. Seu “momentum”, no entanto, havia passado. As fãs pré-púberes de 1985/86, já se dirigiam para aquela nova dança chamada lambada. Além disso, o rock nacional, por conta da recessão que se aproximava por conta do fracasso do plano cruzado, sofria forte retração. Era uma época em que investir pesado num artista deste segmento constituía risco.

RPM ou Quatro Coiotes tem várias canções boas que, pelo fato do disco ter fracassado em vendas (“apenas” 250 mil cópias, marca ínfima para um multivendedor como o grupo) e ter ganho a fama de “difícil”, “maldito”, “arrogante”, suas músicas ficaram com uma simpática aura cult. 

Quatro Coiotes, que abre os trabalhos, é misteriosa, com vozerio indistinto antecedento uma melodia com teclados e algum groove, mas com a letra mixada no meio do instrumental, tornando praticamente impossível acompanhá-la sem o encarte. 

Fez relativo sucesso nas rádios. Partners, com arranjo de metais em brasa, também se constituiu single e chegou a ser tocada no Cassino do Chacrinha. 

Dália Negra, cheia de guitarrinhas e andamento rápido, também é legal. Um Caso De Amor Assim começava abruptamente, com guitarrinha marcante de Deluqui e letra acima da média de Paulo Ricardo. 


Outra aposta ousada foi colocar Bezerra da Silva para duetar com PR em O Teu Futuro Espelha Essa Grandeza, que poderia ser bem melhor.

Depois deste disco, Paulo Ricardo e seus amigos do RPM ainda transitariam pelas paradas de sucesso, ora juntos, ora em trabalhos solo, algumas vezes sob a marca da banda. O vocalista teve uma carreira em que chegou a encarnar um ídolo romântico brega – momento em que fez mais sucesso depois do RPM – mas também durou pouco. 

Por essas e outras, o quarteto paulistano segue com uma aura confusa, oscilando gosto duvidoso, vendagens estratosféricas e tentativas de ousadia artística, entre as quais, certamente está seu terceiro disco.

RPM/Quatro Coiotes foi editado em CD apenas na caixa RPM 25 Anos de Revolução e teve algumas de suas músicas lançadas em coletâneas ao longo das décadas de 90 e 00, todas fora de catálogo.

Fonte: https://monkeybuzz.com.br/materias/cade-quatro-coiotes-o-terceiro-disco-do-rpm/